terça-feira, 14 de julho de 2009

CINEMA DE ARTE

“Valsa com Bashir” é crônica subjetiva e impressionante

Animação israelense premiada que revisita guerra do Líbano será exibida no Multiplex UCI Ribeiro Iguatemi


Vencedora do Globo de Ouro e do César francês como melhor filme estrangeiro, e também indicada ao Oscar de filme estrangeiro em 2009, a animação israelense "Valsa com Bashir" pode ser definida como uma cinebiografia documental em desenho animado. Aliás, de conteúdo bem adulto e dramático, o que deve ter contribuído para que sua censura no país tenha sido definida em 18 anos. O filme será exibido às 10h30 de sábado, no Cinema de Arte do Multiplex UCI Ribeiro Iguatemi.
O diretor Ari Folman, que participou como soldado da segunda guerra do Líbano, em 1982, examina suas próprias culpas para abordar os problemas da reconstituição da memória dos episódios dramáticos que culminaram no massacre dos campos de Sabra e Chatila, em que teriam morrido 3.000 refugiados palestinos. Embora o massacre, tecnicamente, tenha sido atribuído a falangistas cristãos e libaneses, havia tropas israelenses ocupando aquele país - e sua responsabilidade ou omissão no caso continuam a ser objeto de controvérsia.
O filme, entretanto, não pretende resolvê-la, como explicou Folman na coletiva de imprensa em Cannes, onde o filme concorreu à Palma de Ouro em maio de 2008: "Eu queria um filme direto, abordando um massacre.



Soldados são sempre, como se sabe, peões a serviço de lideranças." E a liderança então era o primeiro-ministro Ariel Sharon, posteriormente condenado por uma comissão governamental por permitir os massacres de civis no Líbano.
O tom procurado por Folman é, claramente, o de uma catarse à qual não falta autocrítica. Ele parte da própria falta de recordações de seu tempo de serviço militar no Líbano, entrevistando antigos companheiros de tropa - que, ao contrário dele, têm sua mente povoada por lembranças e pesadelos. O assustador sonho recorrente de um deles, Boaz, é uma corrida noturna de 26 cães raivosos, dentes à mostra, percorrendo as ruas de Tel Aviv. No sonho, Boaz sabe que eles vieram para matar. Recolhendo peças desse quebra-cabeças perdido nas mentes dos amigos, Folman reconstitui em parte a história de uma vingança. Na época, o presidente libanês e cristão, Bashir Gemayel, fora assassinado. O ataque aos campos de refugiados palestinos teria sido o troco por esta morte.
À custa de ouvir muitos relatos, algumas imagens emergem também da memória de Folman - ele sonha consigo mesmo e outros saindo nus da água, de armas na mão, para entrar num campo iluminado por foguetes sinalizadores. Imagem tétrica, pois justamente uma das suspeitas contra as tropas israelenses foi terem disparado estes foguetes, facilitando a visão dos falangistas para as execuções.
Recorrendo à técnica da rotoscopia, a mesma vista em animações como Waking Life, de Richard Winklater, a partir das filmagens das entrevistas para o filme, Folman cria uma crônica da guerra ao mesmo tempo subjetiva e impressionante. Mas nada mais chocante do que as cenas finais, que mostram imagens reais de Sabra e Chatila.



Tudo sobre o filme duplo "Che"

Segunda parte da produção de Steven Sodserbergh sobre o médico e revolucionário argentino Ernesto Guevara, com Benício Del Toro e Rodrigo Santoro, estreia no Cine Ceará 2009

O médico e revolucionário (entre outras coisas) argentino Ernesto "Che" Guevara é uma figura tão polêmica quanto fascinante. Assim sendo, sua trajetória comporta bem mais do que um único filme. No caso do diretor Steven Soderbergh, ele fez dois, e o primeiro deles, "Che", já esteve em cartaz no Espaço Unibanco Dragão do Mar.

Certamente, Soderbergh não foi o primeiro a inspirar-se na aventurosa vida de Che. Em 2004, o brasileiro Walter Salles dirigiu "Diários de Motocicleta", baseado num livro de memórias de uma viagem da juventude do médico argentino. No ano passado, o documentário "Personal Che", de Adriana Mariño e Douglas Duarte, mostrou o quanto o personagem é visto por vários ângulos, desde vilão até santo milagreiro.

O filme de Soderbergh não busca responder quem foi realmente Che Guevara e qual a sua importância para a história do século 20. Trabalhando a partir de um roteiro assinado por Peter Buchman ("Jurassic Park 3"), baseado num livro de memórias do próprio revolucionário, o diretor filma com distanciamento quase documental dois momentos na vida do personagem: a campanha para a tomada do poder em Cuba, em 1959, e a visita à ONU em Nova York, em 1964.

Filmada em preto-e-branco, com uma imagem com aspecto de envelhecida, a viagem de Che (Benicio Del Toro, premiado como melhor ator em Cannes 2008 por esse trabalho) intercala as cenas de guerrilha ao lado de Fidel Castro (Demián Bichir). Nos Estados Unidos, o revolucionário se torna santo e demônio ao mesmo tempo.

Para o governo norte-americano, ele é uma força que deve ser reprimida antes de espalhar a revolução pelo resto do continente. Para outras pessoas, ele se torna quase um ícone pop, imagem que foi reforçada com a famosa foto de Alberto Korda, estampada em camisetas por todo o mundo, tornando-se o panfleto ambulante dos esquerdistas.

Uma fala central em "Che" é dita logo numa das primeiras cenas, por Raul Castro, interpretado pelo brasileiro Rodrigo Santoro ("Não Por Acaso"): "O importante não é tomar o poder; é saber o que fazer com ele." Soderbergh, porém, está mais interessado em mostrar como Che e seus aliados tomaram o poder e não com o que foi feito depois da derrubada do ditador Fulgencio Batista.

Por isso mesmo, Che é visto mais no meio da floresta, atuando na guerrilha, do que nos corredores do poder. A contraposição entre as cenas de luta e a burocracia na visita à ONU faz lembrar que toda revolução precisa, em certos momentos, de diplomacia e negociação.

No centro da obra de Soderbergh está o comprometimento de um homem com seus ideais. Se aqui o diretor mostra a ascensão de Che, com a Revolução Cubana, na segunda parte, "Guerrilha", prevista para estrear nos próximos meses, o diretor explora a queda, com o fracasso da tentativa de revolução na Bolívia, que culminou na morte do guerrilheiro, em 1967.

De qualquer forma, seja nos corredores da ONU, numa festa chique em Nova York ou tendo um ataque de asma em plena selva, o Che Guevara que vemos na tela é uma figura tão fascinante quanto emblemática, uma pessoa disposta a lutar por seus ideais, seja pegando em armas ou duelando com palavras. O primeiro filme termina com Che quase chegando a Havana.

No segundo filme, que será exibido na noite de abertura do Cine Ceará 2009, nesta terça no Cine São Luiz (Praça do Ferreira), após a vitória na Revolução Cubana, Ernesto Guevara (Benício Del Toro) escreve uma carta aberta ao seu amigo Fidel Castro (Demián Bichir) renunciando a todos os benefícios conseguidos para sair semeando a guerrilha por outros países, principalmente da América Latina. Em busca de melhoras nas condições de vidas de outros povos, o argentino deixa a esposa Aleida (Catalina Sandino Moreno) e seus filhos para liderar silenciosamente novas revoluções.

Sob o codinome Ramón, Che chega oculto na Bolívia, um dos países mais atrasados da América, apesar do governo legítimo, e se junta a grupos revolucionários que tencionam tomar o poder. Enquanto antes partia do nada, sua dificuldade agora é o fato de ser uma figura reconhecida mundialmente, e temida por muitos políticos. Esta fama faz com que seu grupo receba apoio de intelectuais de diversos países, além de ajuda financeira. Isto, no entanto, não faz diferença para o grupo, já que até mesmo o dinheiro na selva boliviana não vale nada.

As regiões por onde os revolucionários passam, treinando homens para virarem guerrilheiros, sofre com a fome e a miséria muito mais do que em Cuba. As péssimas condições fazem com que o grupo passe por grandes dificuldades, já que raramente encontram quem aceite vender-lhes mantimentos. Além disso, Mario Monje (Lou Diamond Philipps), chefe do Partido Comunista local, é contra a luta armada e se nega a ajudar. Disposto a obter o mesmo resultado que já conseguiu em Cuba, Guevara resiste bravamente, mesmo com seus constantes ataques de asma. A xenofobia dos bolivianos, no entanto, ajuda na captura do líder comunista.



O projeto de Steven Soderbergh para contar a vida do revolucionário argentino foi dividido em duas partes, Che e Che - A Guerrilha. A produção ficou por conta de Laura Bickford e Benício Del Toro, que chegou a pesquisar por sete anos para viver o papel principal. O brasileiro Rodrigo Santoro, que interpreta Raul Castro, atual presidente cubano e irmão de Fidel, viveu em Cuba por dois meses para saber mais sobre a história de seu personagem. Os dois filmes se basearam no diário escrito por Guevara na Bolívia e em entrevistas com os revolucionários Pombo, Urbano e Benigno, que atuaram em Cuba e na Bolívia e sobreviveram.

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