Morre o Palhaço que era símbolo do Teatro José de Alencar
José Gomes de Sousa, o Trepinha, faleceu na manhã desta segunda, aos 85 anos
Faleceu no final da manhã desta segunda-feira (26) aos 85 anos José Gomes de Sousa, o "Palhaço Trepinha", vítima de uma parada cardíaca. Ele estava internado desde a última quinta-feira, 22, no Hospital Prontocárdio.
O mais antigo palhaço em atividade no Ceará trabalhava no Teatro José de Alencar – TJA desde o começo dos anos 70, oficialmente contratado pela Secretaria da Cultura do Estado. Ele era natural de Bonito de Santa Fé, na Paraíba, e desta cidade fugiu aos 12 anos, acompanhando um circo. Depois de viajar pelos brasis em circos como o Nerino e Garcia, e de ter sua própria lona, ele chegou a Fortaleza a tempo de viver os mundos dos circos que ainda armavam lona no Mucuripe, então bairro de pescadores, e no Centro, o coração da cidade. Sua iniciação no TJA nos remete à sua iniciação ao circo que, por sua vez, lembra as legiões de artistas célebres e anônimos que chegaram à lona por acaso e ali inventaram uma vida para si.
Trepinha contou em entrevista certa vez que conheceu o alfaiate Clóvis Matias nas festas e brincadeiras de rua: “Seu Clóvis me levou para o Theatro José de Alencar, onde era porteiro, trabalhava n’O Mártir do Gólgota”. Na história do TJA, as temporadas d’A paixão de Cristo atraíam multidões. Até hoje, ele fica à entrada do Theatro José de Alencar para convocar o público da rua a entrar no teatro. Um misto de mestre de cerimônia e articulador de público, um palhaço-rito de passagem, em diversos projetos e momentos do Teatro José de Alencar, víamos Trepinmha com megafone na mão, inventando textos, contando causos.
Em um final de tarde de 2008, estava ele no saguão, com um olho na rua e outro no teatro, chamando os passantes para ver Flor de Obsessão, espetáculo-solo do ator e dramaturgo Ricardo Guilherme, a partir do universo de Nelson Rodrigues. Antes, programação oficial na mão, como sempre faz, Trepinha havia ido ao camarim para saber mais sobre o espetáculo. Conversou com o ator, dois mestres partilhando no dizer e no ouvir o universo amoroso-obsessivo do dramaturgo pernambucano. Ricardo Guilherme falou do solo e, sobretudo, de como Nelson Rodrigues escrevia sobre as paixões, sobre a experiência amorosa. Já na calçada do teatro, dizia Trepinha: “Entrem, entrem! Hoje, grande espetáculo do grande ator Ricardo Guilherme. Hoje, Flor de Obsessão, uma história de amor, carinho e chifre. Você não pode perder”.
O menino José Gomes de Souza fugiu da casa do pai, em Bonito de Santa Fé, na Paraíba, no rastro de um circo que havia passado pela cidade. “Voltei de férias para casa, vindo do colégio interno, em outra cidade. Quando cheguei, meu pai me apresentou sua nova mulher. Foi assim que eu soube da morte da minha mãe”. Do desgosto, livrou-se embrenhando nos caminhos até chegar à lona, onde se ofereceu para ficar. “Fiz de tudo no circo: dava água para os animais, cuidava da limpeza, fui aprendendo”.
O corpo do palhaço Trepinha está sendo velado no palco do próprio Teatro José de Alencar, e o enterro será no Cemitério Jardim do Éden, por volta das 9h30min desta terça, 27 de novembro.
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