quarta-feira, 1 de julho de 2015

BASTIDORES

Cartas psicografadas de artistas mortos invadem a internet


Supostas cartas, feitas em centros espíritas, de Cazuza, Raul Seixas, Cássia Eller e Chorão falam de dor e de fase infernal

A carta psicografada que teria sido escrita pelo espírito de Cássia Eller, divulgada nas redes sociais não é o primeiro registro de mensagem que teria sido recebida de um cantor morto. Segundo dirigentes do Lar de Frei Luiz, centro espírita em Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio, médiuns já psicografaram mensagens de Cazuza, morto em 1990, aos 32 anos, e de Chorão, morto em 2013, aos 42 anos. Em 2002, o médium Nelson Moraes alegou ter recebido mensagens de Raul Seixas, que acabaram se transformando em dois livros. O artista morreu em 1989.
No entanto, a veracidade das mensagens não é um consenso entre os familiares dos cantores. Lucinha Araújo, mãe de Cazuza, conta que, quando o filho morreu, recebia diariamente cartas atribuídas a ele, mas nunca o reconheceu nos textos.
- Meu marido dizia para rasgar as cartas e jogar fora. Nunca acreditei nelas, sempre fui muito cética, apesar de respeitar quem acredita. Nenhuma citou apelidos carinhosos, por exemplo. No dia em que realmente for o Cazuza, vou saber - ressalta Lucinha, destacando que perdeu as contas de quantas psicografias atribuídas a Cazuza recebeu nos últimos 25 anos.
Segundo a mãe do ex-líder do Barão Vermelho, o lugar-comum entre as cartas é a afirmação de que Cazuza “está arrependido de tudo que fez”, o que, para ela, não condiz com a personalidade do filho, já que "ele nunca fez nada a ninguém”.
- Uma carta do Cazuza diria que ele está com saudade, que encontrou o pai. Eu iria adorar. Já pensou, falar com ele depois de 25 anos? Torço para que exista outra vida, também quero chegar lá. Mas, até hoje, não acreditei nas cartas - frisou.
Por outro lado, ela diz que costuma pedir sinais ao filho quando tem dúvidas, e que já foi correspondida.
- Eu me comunico com ele pedindo sinais. O sinal é ligar o rádio e ele estar cantando, já aconteceu muitas vezes. Por exemplo, alguém quer publicar uma música inédita dele e pergunto: “Cazuza, o que você acha?”, e, quando ligo o rádio, uma canção dele está tocando. Ele sempre disse pra mim que “acontecesse o que acontecesse, sempre estaria ao meu lado”, e eu acredito nisso - conta Lucinha.
A apresentadora Sônia Abrão, prima de Alexandre Magno Abrão, o Chorão, também não acreditou “em uma linha” da psicografia atribuída ao vocalista do Charlie Brown Jr., divulgada nas redes sociais no início do ano passado. Para ela, o primo jamais estaria sofrendo, como descrito na carta. Sônia acredita que a mensagem pode ter sido transmitida por um “espírito zombeteiro”, que se faz passar por outro.
Na mensagem, escrita em forma de poesia, o autor diz, de forma bastante sofrida, que “voltou aos quintos dos infernos, enlouquecido pelas drogas”, que a morte não o livrou dos “mil tormentos” e que a droga “desfigurou” seu ser. Além disso, diz que pede “em prece a toda hora que não seja mais escravo” e implora que embora “desprovido de paz e luz, sem pátria, família, nem Deus”, “Jesus amenize” os seus sofrimentos, e que “tenha compaixão desse Chorão”.
- Conheço meu primo, sei quem ele é e tudo de bom que fez para a família. Por mais que fosse atormentado, tinha um coração de ouro. Jamais estaria naquele sofrimento. Não aceito, nunca falaria esse tipo de coisa. Não é uma coisa boa para ninguém, passa uma ideia de castigo - avalia a apresentadora, acrescentando que teve a mesma sensação ao ler a carta que seria de Cássia Eller.
No entanto, Sônia lembra um episódio em que um familiar realmente acreditou que estava se comunicando com Chorão: quando a irmã do cantor, Tânia Abrão, morta em janeiro deste ano - quase dois anos após o irmão - visitou uma médium no interior de Belém do Pará.
- A Tânia queria muito visitar a médium, e voltou muito feliz. Ela contou que Chorão encarnou na mulher e falou coisas que só eles sabiam, coisas boas. Passou tranquilidade, disse que estava tentando se encontrar. Combinava muito mais com ele, existia esperança no coração. Era uma ideia de consolo, e não de sofrimento - conta.
De acordo com a apresentadora, a família já recebeu muitas psicografias pela internet, mas nenhuma é levada a sério. Para Sônia, muitas pessoas enviam o material para “aparecer”, então prefere ignorá-las. No entanto, destaca que admira muito a doutrina espírita.
- Ninguém sabe mais dele do que a gente. Imaginamos que ele esteja bem, pois era extremamente humano, solidário, ajudou muita gente que precisava.
Na época da divulgação da carta, o irmão de Chorão, Ricardo Abrão, publicou uma mensagem indignada em sua página no Facebook. “Existem pessoas que se aproveitam da perda de um ser, publicando fatos absurdos, querendo se promover e ainda divulgando mentiras sobre o mesmo (...) tudo não passa de uma mentira”, diz um trecho.
A filha de Raul Seixas, Vivian Seixas, preferiu não comentar as psicografias atribuídas ao pai, mas destacou que “não acredita” que realmente sejam dele:
- Achei uma falta de respeito, inclusive com a família - reclamou.


Leia a carta psicografada de Chorão

Voltei aos quintos dos infernos

Enlouquecido pelas drogas

Com padecimentos internos

Que nem a morte derroga

Hoje de mil tormentos padeço

Deles não me livrou a morte

Por isso aqui e agora peço

Que orem para que eu seja forte

Durmo hoje como um mineral

Sonhando me sinto vegetal

Desperto pareço um animal

Deixei de ser um Ser hominal

Regredi no tempo e no espaço

Meu ser a droga desfigurou

Só o que ela quer eu faço

Já não sei quem de fato sou

Assim é que aqui e agora

Comigo combate eu travo

Pedindo em prece a toda hora

Que eu não seja mais escravo

E liberto desse vício demoníaco

Mais pesado que qualquer cruz

Que me faz sentir um maníaco

Desprovido de paz e luz

Sem pátria, família, nem Deus

Imploro mesmo sem devoção

Que Jesus amenize os sofrimentos meus

E tenha compaixão desse CHORÃO



Leia a carta que seria de Cássia Eller 

"Se eu disser para vocês que o inferno existe, acreditem, pois eu estava mergulhada nele, de corpo e alma, num espaço sombrio e frio, bem interno do ser, dos pés à cabeça, sem tempo, sem luz, nem descanso e afogava-me, a cada segundo, num oceano de matéria viscosa que roubava até minha ilusória alegria… Naquele lugar não havia luz, somente nuvens cinza e chuvas com raios e trovões, gritos estridentes e desesperados, gemidos surdos, pedidos de socorro, lágrimas, desalento, tristeza e revolta…
Preciso descrever mais as cenas dantescas de animais que nos mastigavam e, em seguida, nos devoravam sem consumir nossos corpos; se é que posso dizer que aquilo, que sobrou de mim, era um corpo humano. queria fugir para bem longe dali, mas tudo em vão, quanto mais me debatia no fluido grudento, mais me afundava e, quando alcançava, de novo, a superfície apavorante, mãos e garras afiadas faziam-me submergir naquele líquido pastoso e mal cheiroso.
Dragões lançavam chamas de suas bocas sujas e nos queimavam, machucando e estilhaçando a pouca consciência que me restava da lembrança de minha estada no corpo físico, neste planeta azul. Guardiões das trevas olhavam atentos seus presos e vigiavam todos os movimentos realizados naquele imenso espaço de sofrimentos, dores, lamentos, depressões, angústias e arrependimentos tardios… O ar era ácido e provocava convulsões diversas.
Perguntava-me porque ali estava se nada fizera por merecer tão infeliz destino, depois de ser expulsa do corpo de carne através do uso maciço de drogas. A dúvida assaltava-me os raros momentos de raciocínio menos desequilibrado e as crises de abstinência trancavam todas as portas que dariam acesso à saída daquele campo de penitência de espíritos rebeldes e viciados com eu.
Os filmes de horror que assisti, quando encarnada, estariam ainda muito distantes dos padecimentos, pânicos, pavores e temores que ficariam para sempre registrados na minha memória mental, os piores dias que vivi até hoje, como joguete e marionete de forças que me escravizavam o ser, debilitado, fraco, desprovido de energias, suja, carente e chorosa.
Não me lembrava do que acontecera comigo… Quando o medo é maior que as necessidades básicas, a mente fica encarcerada num labirinto hipnótico e “torporizante” de emoções truncadas e desconectadas da realidade… Assemelha-se a um pesadelo sem fim, sempre com final trágico e apavorante. Quando conseguia conciliar um pequeno tempo de sono; era imediatamente desperta por seres que me insultavam e xingavam, acusavam-me de suicida maldita e jogavam-me lama misturada com pedras… Insetos e anfíbios ajudavam a traçar o perfil horrendo dos anos que passei no umbral. Preciso escrever estas palavras para nunca mais me esquecer: “Com o fenômeno da morte, nós não vamos para o umbral, nós já estamos no umbral quando tentamos forjar as leis maiores da criação com nossas más intenções e tendências viciantes”.
Tudo fica registrado num diário mental que traça nosso destino futuro, no bem ou no mal. O umbral não fora criado por Deus; ele é de autoria dos espíritos que necessitam de um autêntico e genuíno estágio educativo em zonas inferiores, onde poderão se depurar de suas construções aleijadas no campo dos sentimentos e dos pensamentos disformes, mal estruturados e mal conduzidos por nossa irresponsabilidade, de mãos dadas com a imensa ignorância que nos faz seres infelizes e distantes da tão sonhada paz de consciência.
Após alguns anos umbralinos, despertei numa tarde serena, num campo verdejante e calmo. Não acreditava no que via, pois tudo, agora, parecia um sonho… Percebi, ao longe, o canto de uma ave que insistia em acordar-me daquele pesadelo no qual já me acostumava a viver; a morrer todos os dias… Seu canto era uma música que apaziguava meu coração e aguçava meus pensamentos na lembrança de como fui parar ali naquele campo gramado e repleto de árvores. Consegui sentar-me na relva e ao olhar todo aquele espaço natural, deparei-me com milhares de outros seres como eu, nas mesmas condições de debilidade moral, usufruindo, agora, de um bem que não merecia, mas vivia ! Todos nós dormíamos e fomos despertos com música e preces em favor de todos os presentes…
A maioria era de jovens e adultos, poucos idosos e centenas de enfermeiros que olhavam atentos para nossos movimentos no gramado. Com seus olhos serenos, projetavam em nós a mansidão e a paz tão esperadas por nossos corações enfermos, débeis e carentes de atenção, de afeto e carinho.
Alguém me tocava, de leve, os ombros e chamava-me pelo nome, como se me conhecesse há muito tempo. Eu identifiquei aquela voz e “temia” olhar para trás e confirmar minha impressão auditiva, era Cazuza todo de branco, como lindo enfermeiro, de cabelos cortados bem curtos e estendia suas mãos para que eu levantasse, caminhasse e conversasse um pouco em sua companhia. Não consegui me levantar, porque uma enxurrada de lágrimas vertia dos meus olhos, como nascente de rio descendo a montanha das dores que trazia no peito. Meu ídolo ali estava resgatando e cuidando de sua fã, debilitada e muito carente. Ele cantou pequena canção e tive a capacidade de avaliar o que Deus havia reservado para aqueles que feriam suas leis e buscavam consolo entre erros escabrosos e desconcertantes.
A misericórdia divina sempre conspira a nosso favor, nós desdenhamos do amor divino com nossas desatenções e desequilíbrios das emoções comprometedoras, que arranham e esmagam as mais puras sementes depositadas no ser imortal. aprendi palavras boas ! Somente agora enxergo que sou espírito e que a vida continua e precisa seguir o curso natural das existências, como na roda-gigante: hora estamos aqui no alto; hora estamos aí embaixo encarnados. Daqui de cima, parece ser mais fácil compreender porque temos de respeitar as leis e descer num corpo físico para, igualmente, quando aí estivermos, conquistarmos, pelo trabalho no bem, a lucidez que explica porque há a reencarnação, filha da justiça divina.
Após um tempo no campo reconfortante, fui reconduzida para um hospital onde me recupero até hoje dos traumas e cicatrizes que criei no corpo do perispírito. As lesões que provoquei foram muito graves, passei por várias cirurgias espirituais e soube que minha próxima encarnação será dolorosa e expiarei asma, deficiência mental e tuberculose. Mesmo assim, estou reunindo forças para estudar, pois sempre guardamos, no inconsciente, todos os aprendizados conquistados. Reencarnarei numa comunidade carente no interior do Brasil e passarei por muitos reveses, para despertar em mim o valor da vida do espírito na pobreza e na doença crônica. Peço orações e a caridade dos corações que já sabem o que fazem e para onde desejam chegar. Invistam suas forças e energias espirituais em trabalhos de auxílio ao próximo e serão, naturalmente, felizes. Obrigada por me aceitarem como necessitada que sou!"



Carta psicografada de Raul Seixas


“Frente à realidade que me surpreendeu, a metamorfose agora é outra! A Sociedade Alternativa não acontece no embalo dos sonhos mal sonhados, nasce na individualidade daqueles que vivem na real.
Vivi como um cometa que passa e causa espanto, não consegui ajustar-me na órbita que poderia sustentar-me na trajetória rumo a felicidade que sonhei para mim e para os outros. Porém, ainda não apaguei, vou continuar entre a luz e a sombra, procurando minha própria luz em constante metamorfose.
Voltei sem alarde, faço da mente do médium o meu telégrafo para revelar ao mundo das ilusões a verdadeira Sociedade Alternativa, que nos aguarda no universo infinito e que deve ser construída no universo íntimo de cada um, aí e agora.
Depois de atravessar os vales escuros da dor e do sofrimento, minha visão ampliou-se e pude compreender que aqueles que buscam afogar suas ansiedades e frustrações nas drogas químicas e alcoólicas são como epiléticos criados artificialmente, os quais sofrem e fazem sofrer. Por isso, vejo-me na obrigação consciencial de informar aos companheiros que estão a caminho que o sofrimento não pára aí, ele se estende pelos vales espirituais, onde a epilepsia se torna real, processando a duras penas os elementos venenosos inseridos no corpo perispiritual.
Muitas vezes, embalados pelo sonho e pelo lirismo dos poetas e pelo modismo estimulado pela sociedade de consumo, deixamos de enxergar a realidade à nossa volta e buscamos distrair a nossa consciência das responsabilidades inerentes à verdadeira finalidade da vida. Conseqüentemente, alteramos o valor das coisas e os conceitos sobre juventude, lar, família e objetivos, deixando cair vertiginosamente o nosso amor próprio e o amor por aqueles que nos são caros.
Nesse conceito equivocado, tudo se torna lícito, até mesmo o que não convém. Os que viveram esse tipo de liberdade na Terra, como eu, hoje superlotam os vales das sombras à semelhança de larvas, arrastando-se entre o limo e as escarpas dos abismos espirituais, situação que, em alguns casos, pode se prolongar por longos séculos.
Antes de questionar a vida, questione a si mesmo, analise seus conceitos, seus sentimentos, sua gratidão por aqueles que o ajudaram a renascer na Terra e, com certeza, você encontrará uma grande razão para viver e lutar contra o único inimigo que pode derrotá-lo: você mesmo!”




Carta psicografada de Cazuza

 Um Pouco de Mim nas Sedas do Além
“5. Pensava que após ressacas eu era sempre perdoado por
todos os anjos do amor. Tinha sempre uma noção de ser feliz,
aqui esta felicidade é muito mais explorável. Eu já sentia algum ar
novo e certas paisagens dela, nada volta ao seu estado natural
como eu pensava apenas não sou muito como disseram num certo
livro sobre minha insignificante pessoa idealizada. Inventarão o meu
show. Não sei como te oferecer certezas disso, nós ainda vemos
tudo daqui. Estou numa sociedade socialista democrática perfeita.
Eu nunca quis saber destas coisas de eternidade, porque para
mim era coisa de papa. Então arduamente e com certa teimosia
eu procurei algum outro mais legal, foi difícil, pedi que encerrasse
o livro anterior e não divulgasse nada ainda por ordens superiores,
e achei um que já foi muito pirado na vida desde a infância, uma
piração mais controlada, claro, mas que tivesse mais a ver com
minhas intenções de volúpia de escola em palcos de doutor.
Todos já deviam saber que eu não pertenceria a federações,
editoras ou onde existir lucros financeiros em meu nome, excluam-me
disto; onde tiver isso com certeza não será eu. Não quero
ser o mesmo babaca e nunca irei mais fazer parte disso, baby!
Essa é minha vida atual, sempre foi e realmente não podemos
enganar o que vem da natureza. Aqui não tem jogo político. Não
9. adianta inventar que sempre fui o garotinho exemplar da mamãe
depois de aloprar no pó durante minha vida quase toda. Mas,
graças que eu achei um que parecia me aceitar, foi realmente
difícil achar algum que tivesse a ver, mas quer mesmo saber?
Dane-se sobre isto! Eu os apoio e ele entende é muito bem da
minha música, entende muito bem sobre o mesmo amor que
conhecemos nos tempos dos palcos. Eu atacava quem estava
manso e agora entendo que pretendo consertar algumas coisas
dentro de mim, deixar de ser tão bêbado em certos momentos,
estarrado, moleque, preciso controlar mais os meus palavrões. Aqui
temos escolha de sermos mais sérios, e eu escolhi ser um pouco
mais sério mesmo, responsável. Tudo começou alguns segundos
antes da minha morte, apesar de debilitado, eu me sentia muito
vivo apesar de me encontrar sem forças. Eu me sentia apagando
3. como luzes do palco quando não se tinham mais platéias,
acabou, amanheceu! Vamos embora! Eu ainda insistindo com os
meus cigarros nas mãos olhando cores cinzas para onde quer que
os meus olhos olhassem. De repente, o meu corpo franzino de
alguma forma sabia que naquele dia estava mesmo para morrer e
que de alguma forma sabemos quando acontecerá, é bastante
assustador. Eu só aguardava tudo escurecer para depois poder
esquecer de mim. Eu estava ansioso com o corpo dolorido. Eu já
havia atravessado e nem sabia. Eu já havia lido que não doeria e
isso me ajudou bastante a suportar. De fato eu já procurava pelo
momento mais esperado da vida, mas será que já havia
acontecido isso por muito tempo e eu não sabia? Impressionante,
não senti passagens, mas minha visão não foi interrompida em
nenhum segundo. Todo o ritmo tinha o seu fim, doses mais fortes
pareciam que não. Era assim que eu me sentia. Percebi que o
universo era bem maior do que tudo que eu já havia conhecido
com várias atmosferas umas sobre outras. Não sei te explicar, de
alguma forma sabemos o momento exato quando deixamos o
físico, não sei como foi feita essa separação, 8. não flagrei esse
momento como eu flagrava doidão, mas bem atento sobre curvas
de quem adormecia comigo num motel barato de Copacabana;
realmente não senti isso acontecer. E o fato de saber que minha
visão não cessou tornou-se muito maior do que saber de fato
sobre polêmicas do fim, mas depois que atravessei percebi que
esta questão era a mais pueril de todas, é pífia e é babaca, ao
mesmo tempo para mim foi do caral... Saber que eu ainda me
mexia. Mas alguma dúvida ainda pairava toda minha mente.
Realmente havia partido? Era estranho ou um sonho? Pois minha
moleza era muito forte e tonturas me levavam ao delírio constante.
Eu tinha fortes disenterias, dores de barriga, forte abstinência. É
inevitável viver o nosso drama, conhecer-nos detalhe a detalhe.
Foi mais do que dizer coisas insanas no ouvido de um padre no
tempo de escola. No mundo realmente eu me envolvi com tudo
que fizesse parte da música, rock e poesia (mas eu era bom de
letras), mas sabia que não havia nascido 3. para o drama.
Fizeram-me até o garotinho do samba. Aproveitei tudo para
aloprar, cheiração e muita putar... Com os mais luxuosos
segredos. Que bom para mim amor. Ledo engano. E daí se eu
estava com HIV? Não vou dizer que não me arrependi, pois me
arrependi mesmo. Foi muito triste essa fase da minha vida.
Ninguém gosta. Foi no que mais sofri , foi quando soube da
notícia, quando eu pensei na conseqüência, quando eu pensei em
todo o meu passado e na minha mais inocente felicidade de
embriaguez, quando pensei nos meus sorrisos ingênuos. Se eu
pudesse fazer diferente eu teria feito e não teria pego essa porra,
teria me cuidado muito mais e teria morrido pelo menos chique
como uma dama velha ao som da vida em bandos e com uma
bela garrafa de vodka ao meu lado. Esses eram os pensamentos
juntos aos desgostos que ao mesmo tempo eu sentia quando
ainda deitado antes de partir febrilmente. Mas isso não feriu
completamente o meu ótimo senso de humor. Não fui recebido por
ninguém. Seria extremamente infantil que religiões fossem resolver
transcendentes questões deste infinito. Agora que me fiz curioso,
4. sendo assim, quantas existências será que eu tive? Quantos
atos de barbaridades será que cometi? Quantos séculos de
conhecimento será que eu tenho?De serviços? De triunfos?
Quantos sopros renovadores será que eu suportei? No fundo é
muito difícil entender dentro do nosso íntimo sabermos que
continuamos. Você pode até estudar toda teoria, ser “expert” no
assunto, nada é mais forte do que você viver essa situação. Senti
falta foi da minha multidão, das baratas dos palcos apertados, da
minha sintonia com o público, do calor humano, dos meus pais,
da loura que me deu em segredo um par de rosas no almoço,
dos amigos queridos da infância do amor e ódio. Eu queria
mesmo era poder ficar pasmo e maravilhado com tudo que estava
acontecendo comigo. Foi assim que eu percebi que eu não tinha
nada de astro, tudo fazia parte da alegria somente para vaidades.
E essa realidade onde estou é muito diferente. Permaneço por
aqui como um mero espectador na última cadeira do teatro divino.
Estou bem, estou bem, estudando bastante (finalmente peguei
gosto por algum estudo) e indo para recomendadas palestras
continuamente, hoje é o que importa. Nestas palestras sinto-me
2. tomando o mesmo soro. Existe muito mais que eu poderia
dizer, mas através de outros já foi e será melhor dito, não é
minha tarefa. Mas garanto não foi nada fácil o meu inferno astral
após o desencarne. Hoje só estou aqui para somar e ajudar na
sua fé. E eu pensei que ser novo era viver sempre numa fria.
Nessa idade só queremos uma transa boa. O olhar eu traduzia
ser o passaporte para o sexo casual. O sorriso a confirmação
indébita dentro da dose do meu desprentecioso uisk de Leblon. Eu
simplesmente fazia de tudo, até fingia ser príncipe, na verdade eu
estava mais para ser, se continuasse por aí, mais algum
incansável bobo da corte. ‘Dias sim, dias não.’ Ou ‘Segredos de
liquidificador.’ Ou ‘Partidos’. Ou ‘Burguesia’. Não importa mais.
Desculpe pelas minhas interpretações doidas e pelos meus
estresses nervosos. Desculpe de paixão a todos. Eu não venceria
minha provação por isso de repente fui retirado abruptamente da
vida, mas também amenizei muito mais dores da punição e sou
muito grato por tudo que eu fiz. Que Deus os proteja hoje e
sempre minha querida até então última humanidade, pais, todos os
meus fãs e amigos. Só queria que soubessem que agora
encontro-me mais completo, feliz, aprendendo novas boemias, o
de sempre, reaprendendo, cantando novas músicas, nada de
drogas, nada de egos. Beijos!”

Preferiu não se identificar, 1996.
Psicografia

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