O compositor da Bossa Nova se apresentou com Leila Pinheiro e super grupo. Agora o festival segue para Jeri, até domingo
"Vamos celebrar 66 anos da bossa nova e homenagear esse grande nome da música no Brasil e no mundo. Vamos reverenciar Roberto Menescal!"
O chamado de Leila Pinheiro, na noite deste domingo em Fortaleza, no anfiteatro do Centro Dragão do Mar lotado e com fila de espera, na segunda noite do Festival Choro Jazz 2024 na capital cearense, foi seguido por aplausos de pé para Roberto Batalha Menescal, autor de tantos e tantos clássicos da bossa, da canção. Ambos foram apresentador por Antônio Ivan Capucho, idealizador e diretor do festival, como "nossos ídolos", em uma fala emocionada, destacando os 15 anos de festival, celebrados nesta etapa na capital cearense.
Com a humildade e a generosidade que chamam atenção de todos nos bastidores do festival, como sempre acontece onde quer quer se apresente, Menescal agradeceu com o olhar, sentadinho, empunhando sua guitarra Sadowsky, como que a dizer: "Que é isso?"... E a agradecer à parceira de tanto tempo de estrada, parceria registrada em trabalhos como o DVD "Agarradinhos", em que tocam na sala de música de Leila e em que Menescal percorre o jardim, como tanto gosta, especialista em bromélias que é.
E ao lado de Itamar Assiere (teclado e direção musical), Alexandre Caldi (saxofones alto e soprano e flauta), Rômulo Góis (contrabaixo) e Marcio Baía, uma seleção de craques como Menescal costuma escalar, para tocar a bola e as bossas com suingue, objetividade, musicalidade, muito, muito suingue. "No balanço da bossa". Deixando a música fluir e as canções falarem por si. Afinal, com uma intérprete tão precisa, elegante, carismática quanto Leila, como ser e fazer diferente?
É correr pro abraço, com o sabor de "Desafinado", "Garota de Ipanema", "Samba do avião" e do medley "Lobo bobo", "Saudade fez um samba", "Você e eu" e "Se é tarde me perdoa", celebrando as canções de Carlinhos Lyra. Antes do que Leila descreveu como "uma breve homenagem a essa grandiosa interprete que foi, é e pra sempre será nossa querida Leny Andrade, que eternizou essa canção. Eu canto mas é a voz dela que tá aqui dentro da minha alma", disse, antes de uma versão curtinha do clássico de Durval Ferreira e Mauricio Einhorn, "Batida diferente".
Hora então de outro medley, desta vez com canções de Jobim, lembrando os 30 anos desde a despedida do maestro soberano. Leila convidou o público para a temporada que fará com Menescal no Rio, em janeiro, e emprestou a cor e a exatidão do seu canto a "O amor em paz", "Meditação", "Ela é carioca". Tudo com muita musicalidade.
Primeiro momento intimista da noite, então, com outro clássico absoluto, "Preciso aprender a ser só", dor irmãos Marcos e Paulo Sergio Valle, em uma versão pungente, mas também curta, logo alternando para as suingadas "Samba de verão" e "Gente", também da dupla.
"Este ano a agente se despediu desse gigante da música brasileira. Já fizemos um medley dele. Tô falando do nosso querido Carlos Lyra. Faço agora uma das músicas mais lindas do mundo. Parceria dele com Vinicius de Moraes", anuncia Leila, antes de interpretar "Primavera", sob o olhar de ternura e admiração de Menescal, com o piano de Itamar e um lindo solo de sax soprano de Alexandre Caldi.
"É que eu gosto tanto dela, que é capaz de ela gostar de mim...". Cada palavra é pensada, sentida, esculpida por Leila: "É que o meu amor é tanto, é um encanto que não tem mais fim. E no entanto ela nem sabe que isso existe, e é tão triste se sentir saudade...". O maior momento do show, em expressão e sentimento!
O quarteto de instrumentistas deixa o palco e Leila então assume o piano, em dueto com Menescal. "A gente homenageia outro grande compositor brasileiro. A gente nunca quer que partam. Mas seguem por aqui. Eu acredito nisso. Eu tô falando de João Donato. Vamos fazer essa parceria dele com Lysias Enio, irmão dele, que é com quem ele mais compôs", destacou.
"Gravamos juntos aqui em Fortaleza, com Ricardo Bacelar no estúdio dele, que é um dos melhores estúdios do mundo, um álbum todo dedicado a Donato. E está nas plataformas. Quando eu comecei a cantar, plataforma era de petróleo", disse, para risos da plateia e com os cumprimentos a Ricardo e Manuela. "Então acho muito estranho a gente falar de plataforma, mas o álbum está nas plataformas. Vamos fazer essa música que não está no álbum, mas é um clássico", continuou, antes de tocar e cantar "Até quem sabe", uma das mais elegantes e melancólicas das canções de Donato, com o sutil acompanhamento de Menescal na guitarra e com "aqueles" vocalises donatianos.
Leila e Menescal no Pirata em 1989
"Lá em 89 ele me contou uma das melhores mentiras da vida. Me convidou a fazer um álbum que seria só pro Japão. A gravadora queria. 'Vai ser só pro Japão. Pode parar o seu álbum, a gente grava esse'". Fui pro Japão com ele. Em 88, eu acho. E o disco foi lançado no Brasil, e aí foi o primeiro grande estouro da minha carreira. E eu me lembro que a gente cantou aqui no Pirata. Não tinha ponte metálica. Tinha o 'under grade', lotado de gente. Foi muito lindo, Menesca ficou louco. E foi confirmando o acerto da escolha dele pra lançar esse disco no Brasil", compartilhou a cantora.
"Rodamos o Brasil, fizemos mais de 200 shows, e eu pedi pra voltar pra casa, porque eu não sabia mais onde tava dormindo, não reconhecia mais o meu quarta. Agora a gente faz um medley dele, que está nesse álbum, acrescido de alguma coisa mais".
E vieram, sempre em versões curtas, "Ah se eu pudesse", "O barquinho", com um convite para Menescal cantar, e "Você", naquele dueto cheio de bossa, suingue, carinho. E que bom que o medley passou por toda a poesia de "Nós e o mar", no canto enternecedor de Leila. "Lá se vai mais um dia assim, nossa praia que não tem mais fim acabou...". E pelo "Rio" de Menesca e Bôscoli. "Rio é mar, eterno se fazer amar...".
E tome clássicos e mais clássicos. "Triste e viver na solidão...", cantou Leila pertinho do contrabaixista Rômulo Góis, nos vocalises. "Brigas nunca mais" com um show de divisão quebrada. "Vivo sonhando" com a flauta de Alexandre e a musicalidade elegante e expressiva de Marcio Baia.
"Pra que chorar" volta pra bossa mais cadenciada. "Pra que chorar se existe amor. A questão é só de dar, a questão é só de dor". E Baden e Vinicius: "Deixa, deixa quem quiser falar, meu bem...". "Samba da bênção". E muito mais, sucessos passados em revista, pela dupla e pelo quarteto. "Ponha um pouco de amor numa cadência e vai ver que ninguém no mundo vence a beleza que tem um samba não. Porque o samba nasceu lá na Bahia, e se hoje ele é branco na poesia, ele é negro demais no coração".
No bis, "Chega de saudade". Choro e jazz. Leila e Menesca. E Itamar e Rômulo e Alexandre e Marcio. E o anfiteatro lotado cantando. Melhor final impossível para a etapa Fortaleza. Agora é em Jeri!
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